quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Review Doctor Who 9x11 – Heaven Sent / 9x12 – Hell Bent




Sorria para mim, vá em frente, Clara Oswald. Sorria para mim uma última vez” – 12º Doctor

Chegamos ao final de uma temporada esplendorosa que nos foi entregue, revelações contundentes sobre os acontecimentos de The Day of The Doctor culminaram nas inúmeras questões que cercavam a mente dos Whovians. Simplicidade é um termo sútil para dizer o quão os roteiristas dessa série sabem nos emocionar e guardar o melhor para o final. Não somente isso, tornar toda uma aventura continuar girando e seguir em frente. Creio que esse seja uma das grandes sacadas do porquê Doctor Who permanece até os dias atuais.
O arco final da nona temporada possui uma linha tênue de construção, direção, diálogos e acontecimentos, que por consequências desembocam em ações. E são essas qualidades que torna esse um dos melhores finais já vistos na Era Moderna. Steven Moffat revisita o script trazendo um personagem, um cenário e um vilão. Simples não? Super intimista, quando o Doutor se encontra sozinho.
Heaven Sent levanta um clima de perseguição, e a direção de Rachel Talalay, que já trabalhou nos capítulos Dark Warter/Death In Heaven colabora para o sucesso desse momento particular de um Time Lord e suas dualidades. Ela coloca a câmera na posição de perseguidora e perseguida. Sob o olhar da câmera, cada corredor vira uma perseguição infinita, um medo sem fim. Uma verdadeira aula de direção.
A chance de se utilizar de elementos visuais aqui fica nítida e bem aplicada. Vale o destaque para a TARDIS que se torna uma metáfora visual para o estado mental do Doutor e Talalay consegue transmitir milhares de pensamentos com apenas uma imagem. A diretora se provou saber trabalhar um épico numa escala mínima. (Espero revê-la em futuros capítulos).
Ao invés de finalizar com um esgotamento dramático, Heaven Sent incorpora os principais temas da temporada. Peter Capaldi apresentou um dos seus melhores momentos vivendo o 12º Doutor, atuação essa digna de prêmios. A equipe de produção está de parabéns pela formulação desse episódio-monólogo bem elaborado. E a trilha sonora de Murray Gold finaliza como o retoque final, insubstituível.
E de uma solidão intimista, daquilo que deveria ser o ‘pré-paraíso dos Time Lords”, o Doutor passa, ardendo de raiva, para o “inferno dos Time Lords”, a Matrix, após sua chegada em Gallifrey. Um presente aos amantes do audiovisual, pelo vislumbre de como essa season finale soube ser absolutamente fantástica.
Toda uma a qualidade no desenvolvimento do roteiro e das inúmeras referências e metalinguagem com a própria série, além de em um segundo plano o roteiro trazer questionamentos metafísico e posicionamentos políticos. Em detrimento da pessoa que o fez se curar, reconhecer o quão poderoso e corajoso é. O Doutor abandona todos os seus códigos e regras, que ele mesmo criou. Mas apenas 5 minutos antes do Universo ser consumido pela ordem natural das coisas, faz ele se dar conta de que havia longe demais. E a ira, o amor e a obstinação dão lugar à rendição e à constatação de que ele seria, de verdade (e juntamente com Clara, como Ashildr/Me havia teorizado) o híbrido, o destruidor.

Todo o gancho sobre o híbrido, que aterrorizava o alto conselho de Gallifrey foi apenas uma manobra do Doutor para o mesmo poder salvar Clara de sua eminente morte, mostrada em Face The Raven. E assim de forma inesperada Clara volta a narrativa, congelada entre seu penúltimo e último batimento cardíaco.



“Memórias se tornam histórias quando nós esquecemos elas, talvez algumas delas se tornem letras de música” – Oswald Clara

A eminencia do Doutor em salva-lá não é nem de longe exacerbada. Desde que foi introduzida na série, em Asylum of the Daleks, a Garota Impossível teve importantes e significativos papéis. Não só ao salvar o Doutor em The Name of the Doctor, como parte de Clara a iniciativa de questionar o Doutor em The Day of the Doctor para salvar Gallifrey.
Amy e Rory são citados com maestria, e o cenário utilizado pelos personagens junto ao anterior 11º Doutor. Pois foi Clara que o trouxe conforto a este Doutor que perdeu seus dois amigos em The Angels Take Manhattan; à pessoa que fez com que ele perseguisse um mistério de identidade e acabasse descobrindo que ela havia se sacrificado e se multiplicado por ele, para salvá-lo; à pessoa que protagonizou seu diálogo com os Time Lords e esteve lá quando suas regenerações esgotadas não eram mais um problema; à pessoa que lutou contra a estranheza da mudança e tentou aceita-lo em seu novo corpo; à pessoa que, mesmo que comum passou por um tremendo conflito moral, o acompanhou e acabou se tornando com ele, formando um híbrido de humana e Time Lord (em uma das interpretações do termo) ou permitindo que ele agisse como um híbrido, em resumo, aquele que “traz a destruição”.
Remodelar a morte de Clara (que sim, agora é uma espécie de zumbi e sim, vai voltar para o Corvo um dia, mas pelo visto ainda vai viajar muito ao lado de Ashildr/Me, quase como uma extensão do papel do Doutor que ele sabia interpretar tão bem…Clara Who?!)
Temos a presença do celeiro, lugar onde marcou a infância do Doutor, como vimos em Listen. Durante a Time War, o War Doctor se utilizou do celeiro como local de preparação para a execução de Gallifrey através da arma Moment, como visto em The Day of the Doctor. Em Hell Bent, logo após se libertar da prisão que Rassilon o colocou (seu próprio Disco de Confissão), o Doutor ruma direto para o celeiro.
Mas não há como negar que o destaque do episódio são as atuações de Peter Capaldi, Jenna Coleman, Maisie Willians e a participação mais que especial de Donal Sumpter como Rassilon, que já participou de Doctor Who em 1968 no arco The Wheel in Space e posteriormente em 1972 no arco The Sea Deavils. Maisie Willians se mostra uma atriz muito madura para sua idade, conseguindo passar as diferenças psicológicas que sua personagem sofre ao longo dos séculos em olhares e trejeitos mínimos, mas soando totalmente diferente em suas várias aparições pela temporada.
Peter Capaldi e Jenna Coleman mostram todas suas raízes dramáticas teatrais no momento final em uma interessante referência ao 10° Doutor e Donna, só que as avessas, sendo desta vez o Doutor o afetado e perdendo sua memória sobre a existência de Clara. Vale a lembrança de dois pontos: um deles é a Tardis onde Clara e Ashildr/Me estão viajando, referenciando a série clássica em sua forma mais genuína. E o segundo ponto vemos a Clara Who revertendo a polaridade do fluxo de nêutrons como o 3º Doutor.


No mais fica minha salva de palmas a esse arco finalizador bem elaborado, não poderia pedir por algo melhor. Referenciando o Velho Oeste Clássico, não teve como não lembrar de filmes como “Por um Punhado de Dólares a Mais” e mesmo de “Matar ou Morrer”. Ao longo do capítulo fica evidente a relação entre as classes sociais em Gallifrey, a conturbada relação do Doutor com os Time Lords e a sempre perturbadora ação dos mesmos em relação a quase tudo ao seu redor recebendo imenso tratamento dramático, fazendo desse final uma excelente homenagem televisiva ao homem solitário que eventualmente possui um companheiro ou uma companheira ao longo do caminho, mas que por diversos motivos sempre acaba sozinho, tentando salvar alguma coisa que ele não sabe exatamente o quê e, ao menos a curto prazo, para quê. Exatamente como os pistoleiros do Velho Oeste, só que ao final, ao invés de cavalos perdidos a um pôr do sol silencioso, temos duas TARDISes cruzando o espaço e tempo. Um final digníssimo para uma temporada primorosa que foi esta.
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