No nono episódio o escritor Mark Gatis trouxe um ritmo
completamente distinto, no qual a temporada vinha apresentando. Enquanto até o
momento tivemos arcos compactuados, com seus respectivos desenvolvimentos de
personagem em Sleep No More vemos que os casos da semana não dormem quando o
assunto é Doctor Who.
Em uma ousada trama horripilante numa base espacial em
Netuno vemos o Doutor e Clara encarar Sandman de Neil Gaiman ou quase isso. No
século 38 a máquina Morfeus criada pelo cientista Rassmussen, acaba sendo a
origem de toda uma questão sobre o abuso de poder. Essa máquina provoca alterações
químicas no cérebro, além de, conseguir proporcionar ao indivíduo toda a
experiência e benefícios de uma noite de sono em apenas 5 minutos.
A narrativa envolvida pelo terror do found footage, faz
acima de tudo uma crítica sobre o poder e a influência das grandes corporações
no modo de vida da humanidade, para que em segundo plano tornar-se-á um
verdadeiro ensaio sobre metalinguagem ao próprio ato da criação artística.
A direção de Justin Molotnikov consegue ser eficiente ao
manter o clima de suspense e tensão. Traz de forma moderna uma ponte com The
Ark In Space e por tabela, com o longa Alien, o Oitavo Passageiro, e a citação
da ‘Grande Catástrofe’, que ocorreu pela primeira vez em Frontios (1984) na
quinta reencarnação do Doutor. A direção primeiramente ganha pontos pela
linguagem visual escolhida, ao ter durante todo o episódio a trama contada
através de planos subjetivos do ponto de vista dos personagens, com falhas de
sinais e recortes de câmeras de vigilâncias. A palheta de cores frias e na sua maioria
azulada contribui não só para o clima futurista que a narrativa pede, como
também ajuda manter o clima de angústia.
O capítulo procura flertar com uma proposta experimental da
câmera na mão, sob perspectiva de cada personagem. E a partir do clímax, o
final “em aberto” torna o roteiro mais rico trazendo à tona um diferente tipo
de interação entre expectador e obra audiovisual. A partir da bagagem cultural,
social, política e religiosa de cada indivíduo uma nova e diferente leitura
para a obra poderá ser proposta o que eleva o nível da discussão.
Um dos pontos altos do episódio está na riqueza ao citar o
segundo ato de Macbeth de Shakspeare e a famosa gag da segunda encarnação do
Doutor. Destaque para atriz Bethany Black, que vive a personagem 474, e já fez
história sendo a primeira atriz transsexual em Doctor Who.
A verdade é que Justin Molotnikov transforma o texto de
Gatiss em uma história sobre como fazer uma história. Com um caso natural em
que se encontram o Doutor e sua companion, o mesmo cumpre seu propósito básico,
com uma trama deslocada da sequência. E para os fãs de games de tiro em
primeira pessoa, esse episódio ganha pontos por ter tal elemento na hora da
ação, nos impedindo de ficarmos entediados.
Aos expectadores que apreciam roteiros límpidos e meticulosamente
explicados não se apegarão a Sleep No More. E certamente o julgarão como um
capítulo mais fraco, se duvidar o mais fraco da temporada até o momento,
entretanto, ao explorar o gênero found footage com perspicácia pôde-se extrair
mais de um caso da semana, do que normalmente o mesmo faria. Ao invés de apenas
contar a história, terminamos com aquela dúvida se o que realmente ocorreu é
real.
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